Ao longo do século passado, três rupturas paradigmáticas se sucederam em vertiginoso ritmo e sem que as escolas disso se dessem conta. Após décadas de adaptação de teorias a realidades mutantes, Thomas Kuhn foi escutado, quando nos falou de um paradigma emergente.
Nos estados-nação da Prússia, da França e da Inglaterra do século XIX se gestou a escola da modernidade. Fundada no paradigma da instrução, respondeu a necessidades sociais da época. Quase hegemónica, atravessou todo o século XX. A “escola tradicional”, como era chamada, tinha por referência a filosófica proposta de Coménius, que, no século XVII, dizia ser possível ensinar todos como se fossem um só. E o primado da ensinagem perdurava, obsoleto e funesto, no tempo de irdes à escola, no início do século XXI.
A par da denúncia de Ferrière, que dizia ser a escola uma invenção do diabo, Montessori, Steiner, Decroly, Freinet, Dewey e muitos outros escolanovistas propuseram que se passasse do magistercentrismo à centração da atividade escolar no aluno. Porém, o paradigma da aprendizagem, nas suas diferentes reinterpretações e correntes pedagógicas, foi adotado em escassas instituições.
Com a descoberta do computador, a segunda revolução industrial emergiu, para logo dar lugar a uma terceira, aquela que marcou a aparição da Internet e da automação. As escolas passaram a adotar a lousa digital, fez-se educação à distância, foram criadas redes de ensinagem. Surgiram absurdos como o ”ensino híbrido” e a “aula invertida”, paliativos radicados no paradigma da instrução, mas que se reclamavam do paradigma da aprendizagem.
Entre a primeira e a segunda revolução industrial, o carvão foi substituído por outra fonte de energia: a eletricidade. O telégrafo deu lugar ao telefone. A máquina a vapor foi considerada obsoleta. Mas a escola continuava tão obsoleta como dantes. E assim entramos no século XXI: no advento da Internet das coisas e do wi-fi universal, um paradigma humanista predominava nos documentos de política educativa. Porém, no vosso tempo de escola, ainda pontificava o paradigma racional, a par do tecnológico, que ganhava relevância, por efeito da ingenuidade pedagógica de entusiastas do uso das tecnologias digitais e de um financiamento maciço de pseudo-inovações.
Com os trabalhos de Lauro, Papert, Freire, Flexa, Morin e outros insignes teóricos, um novo paradigma emergia, entretanto: o paradigma da comunicação. Mas, as escolas a ele se mantinham alheias e na universidade se vivia na ilusão da ensinagem. Sucediam-se as teses sobre o paradigma da comunicação. Paradoxalmente, os seus autores continuavam reproduzindo práticas fósseis, incompatíveis com o paradigma que, só teoricamente, haviam adotado.
As aceleradas mudanças sociais e a inovação tecnológica, face aos dados da pesquisa no campo da neurociência e da inteligência artificial, ou da sutil convergência entre a teoria da complexidade e a produção científica radicada no paradigma da comunicação, exigiam que se reconhecesse a necessidade de operar profundas e urgentes rupturas. Com referência ao paradigma da comunicação, a produção científica anunciava a aprendizagem centrada na relação. Mas, a Universidade e as escolas recriavam rituais sem sentido e de difícil erradicação... em sala de aula
Embora vos pareça inverosímil, antigamente, era assim. Até que se compreendeu ser necessário não dispensar, mas integrar paradigmas. Até que se percebeu que nos processos de aprendizagem não havia centro, mas relação humana.
