Reitero aquilo que vos disse: comprei o terreno, para uma comunidade, não para mim. E, dado que eu fizera “voto de pobreza” e não queria ser proprietário do que quer que fosse, pedi uma pessoa que fosse a “proprietária”. Com ela fiz um acordo: ficaria com metade, entregando a outra metade à guarda de uma comunidade.
Durante algum tempo, lá morei, ajudando a criar condições de salubridade, contribuindo para alimentar crianças famintas de pão e de afeto. Depois, fiquei por perto e disponibilizei o meu espaço, para que voluntários o habitassem.
Um topógrafo fez o estudo da divisão do terreno e apresentou uma proposta. A “proprietária” concordou com a proposta. O processo se completou com a criação de uma associação, que iria gerir o projeto. E eu sugeri que ela entregasse metade da propriedade à comunidade, ou que fizesse um “contrato de comodato” (direito de superfície) com a associação.
Nada disso aconteceu. No janeiro de vinte e cinco, ilegalmente, a “proprietária” e outras pessoas tentaram “desativar” uma associação, entretanto constituída para gerir um projeto. Lede o que ficou gravado numa rede social, dito por uma voluntária.
“O L. chegou 
Ele pode ficar na sua casinha? Que dia tu retorna?”
“Zé, a C. chegou aqui com um senhor dizendo ser topógrafo que veio fazer orçamento.”
“Posso pedir ao A. para nos ajudar a preparar os termos de responsabilidade e autonomia? É preciso saber se vamos ser ONG, fundação, instituição...”
“Precisamos de doações para nossa festa. Eu mandei mensagem a algumas pessoas. Conseguimos um pula-pula de graça. Precisamos de prendas. Comidinhas e bebida. Já temos pipoca, canjica, arroz-doce e milho.
”
A minha filha está ajudando. Lavou o banheiro, arrumou o quarto. Recolheu as roupas. Está cuidando com responsabilidade dos animais. Me fez café ontem. A coisa mais linda. Bagunça um pouquinho pra fazer as coisas. Mas ela está aprendendo né?!”
“Me diga uma coisa. O nome da nossa comunidade será mesmo Comunidade de aprendizagem Lagoa das Amendoeiras?”
Uma comunidade começava a tomar forma. Até ao momento em que a corrupção moral se manifestou. A “proprietária” renegou o acordo firmado e, por meios ilícitos, tentou destruir a associação. A comunidade ficou à mercê de gente de baixa estirpe moral. E eu lancei um apelo a juristas fiéis ao projeto, para que interviessem e impedissem que a associação fosse destruída.
Mensagens de apoio chegavam, quase diariamente. Como a da Clarice:
“Boa noite, Zé! Como você está?
Tenho lido diariamente suas cartas, ao mesmo tempo que nos alerta aos perigos, nos faz acreditar nos caminhos possíveis da tarefa árdua de fazer a mudança acontecer. Conte comigo!
Por favor, me digas como posso apoiar/colaborar de forma mais efetiva com o projeto.
Não desistiremos!
Avante!”
Cerca de uma centena de educadores solicitaram serem sócios da Associação e muita mais gente ética se juntou num verdadeiro coletivo, numa Assembleia das Redes de Comunidades de Aprendizagem, na intenção de ajudar esse e outros projetos em risco de desaparecimento. E perguntavam:
O que irão fazer os membros da Associação? Cadê a fidelidade a princípios, a coragem, a decisão ética?
O que irá fazer o Ministério Público? E a Defensoria Pública?
Por que razão os conselhos tutelares não intervêm, para cumprir o E.C.A. e proteger crianças e uma comunidade feita de gente humilde e pobre?
Permitirão que crianças sejam vítimas do egoísmo e de corrupção moral?
