De Petrópolis me chegou esta mensagem:
“Bom-dia, querido, amigo. A boniteza de hoje vem dos frutos do pé de amora que você plantou aqui em Petrópolis no ENARC de 22. É tempo da colheita dos bons frutos e da semeadura de novos.
Um abraço fraterno.”
O André era um garimpeiro de beleza. Possuía um dom extraordinário, o de descobrir beleza oculta e de a partilhar. Na Petrópolis dos anos vinte, um oásis de seres sensíveis operava transformações. A Cecília porfiava pela continuidade do belo projeto do Alto Independência, mas a opinião pública mantinha-se alheia à necessidade de proteger esse e outros projetos de vis tentativas de destruição.
Seria necessário repensar uma economia predatória e pensar um modelo de economia solidária. Mas, no campo educacional, insistia-se na manutenção de práticas instrucionistas, embora dispuséssemos de práticas potencialmente inovadoras – a vida das escolas se normalizara numa anormalidade.
Inexplicavelmente, apesar de tantos congressos e ações de formação, as práticas mantinham-se idênticas àquelas que eu conhecera há mais de meio século. Nos livros que eu lia, nas palestras que escutava, era consensual a crítica do modelo epistemológico que predominava nas escolas, desde há séculos. A crença na transmissão linear de saberes sobrevivia na agonia do modelo de escola instrucionista.
Se o modelo epistemológico falira, restava saber por que razão, ainda que moribundo, se mantinha o modelo organizacional que o suportava. Se havia muitos modos de fazer escola, eles teriam sido experimentados? Se havia disponível tanta teoria crítica, por que ainda havia salas de aula?
Bachelard dissera que o ato de conhecer se dava contra um conhecimento anterior e que seria impossível anular, de um só golpe, todos os conhecimentos habituais. Detectávamos causas da inércia às quais dávamos o nome de obstáculos epistemológicos.
A mesmice das teorias era da mesma natureza da mesmice das palestras de saliva e power point. O discurso continuava a contrariar a prática do discurso – para um pensamento único um modelo único. A síndrome do pensamento único não questionava uma normose, que tendia a perenizar rituais sem sentido.
Foram muitas as teses que elegeram por objeto de estudo os obstáculos à mudança. Os seus autores lecionavam como os “doutores” de cem anos atrás. O que os impediria de agir em coerência com as conclusões das suas teses? Talvez porque os seus livros de autoajuda pedagógica – best-sellers desse tempo – criassem a ilusão de que seria possível “melhorar” o trabalho em sala de aula.
Formadores “especialistas” dissertavam sobre diversidade perante turmas que supunham ser “homogêneas”; ensinavam métodos ativos a alunos inativos; “praticavam educação inclusiva”, ensinando tudo a todos, como se de um só se tratasse, tal como preconizara o monge Coménius, no século XVII.
E eu me quedava perplexo face a teóricos que dissertavam sobre mediação, sem jamais a praticarem. Ficava confuso perante “construtivistas”, cujas práticas eram a negação do construtivismo. Após alguns anos de experimentalismo reformista e de tentativas de psicologização do ato de aprender, tínhamos nas escolas mais do mesmo. A normose se instalara, porque todo hábito, uma vez adquirido, se instalava no subconsciente.
Não seria necessário inventar novos conceitos ou rebatizar conceitos antigos. Necessária seria a assunção de uma decisão ética, para que acontecesse uma necessária, urgente (e já possível!) reinvenção das práticas – e a regeneração (ou substituição) de um Sistema.
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