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Pernambués, 21 de novembro de 2025

Na década de sessenta, Lauro tinha publicado a obra “Escola da Comunidade”. E era de comunidade de aprendizagem que o mestre Anísio, a seu modo, nos falava. O malogrado Mestre pugnava por uma nova escola, que substituísse aquela que reproduzia formas arcaicas de ensino pela “exposição oral” e “reprodução verbal”. Uma nova escola, irmanada com outras instituições de transmissão da cultura, “em uma comunidade altamente complexa e de meios de vida crescentemente especializados”.

Porém, status quo res erant. No Brasil da educação ainda impera o teoricismo, o tráfico de influências e a “incompetência especializada”, reforçadas pela indiferença de uma sociedade civil apática. Mutatis mutandis, os regulamentos paridos pelas secretarias da educação e pelo ministério nada mudam, nada alteram, são concebidos como meros paliativos dos males do “sistema”. O problema não é meramente conjuntural. Funcionários movidos por Interesses corporativistas ou outros obscuros interesses fomentam corrupção; teoricistas encartados são a base desse hierárquico e autoritário sistema.

Anísio Teixeira recomendava “fazer escolas nas proximidades das áreas residenciais, para que as crianças não precisassem andar muito para alcançá-las (…) atividades na biblioteca, nas quadras de esporte (…) reorganizando os tempos”. Anísio sabia que a delimitação do território educativo não era apenas uma questão de natureza geográfica: “O estudante não é só da professora ou da escola, e sim da rede, da Cidade (…) em praças, clubes, cinemas, comércio local, teatro (…)”. E concluía:

“O aumento do tempo de estudo deve vir acompanhado da ampliação do acesso dos estudantes aos espaços múltiplos para apropriação da cidade e de seus saberes”.

Mas, tal não aconteceu. Não se trata de deslocar a atividade escolar para outros espaços, escolarizando ainda mais a família e a sociedade, mas de desenvolver a perceção dos territórios como elementos educadores, por meio dos quais se aprende, participando de transformações pessoais e sociais.

As escolas permanecem socialmente isoladas, fundadas em estranhos rituais e contraditórios hábitos, jamais questionados, à imagem e semelhança das congéneres académicas… no contexto de um sistema de ensinagem hierárquico – “o exemplo vem de cima”.

Urge concretizar um re-ligare família-sociedade-escola. Por que não considerar as escolas como espaços públicos, nodos de redes comunitárias, devolvendo as escolas às comunidades, na partilha da responsabilidade de educar?

Entre a escola, a habitação, a associação cultural, a biblioteca pública, o local de trabalho, seria necessário estabelecer uma corrente de interação humana capaz de dar sentido ao quotidiano das pessoas e, assim, influenciar positivamente as suas trajetórias de vida. O Mestre Lauro isso propunha, já na década de… sessenta.

Perguntastes: Por que motivo insisto em falar de Anísio – vos respondo.

Na cartinha de ontem, citei autores incessantemente referidos em documentos oficiais, textos-bases de reformas, teses e outras produções de ficção científica pedagógica.

Os seus autores enchem a boca de Anísio e traem a memória de Anísio. Festejam Darcy, mas são incoerentes – não praticam Darcy. Teorizam Freire, demonizando a “educação bancária”, mas são freudianos não-praticantes.

Em breve, vos falarei de castas seitas e confrarias pedagógicas onde se acoitam teoricistas e quejandos. Por agora, apenas vos recordarei uma tarefa que precisais cumprir nesta semana: conceber roteiros de pesquisa.

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