Em nenhum lugar encontrei inovação, apenas achei arremedos de paliativos reciclados. Mas, aproveitei a oportunidade de rever amigos: o Rui, responsável nacional da formação de professores e o Henrique, diretor de um centro de formação.
Conheci o Rui, quando jovem candidato a professor. Acompanhei-o até ao seu doutoramento. Conheci o Henrique, quando ele ainda era criança, filho do um amigo, que me deu lições de coerência. Ambos alcançaram um estatuto profissional de nomeada. De algum modo, ambos “passaram” pela Ponte, mas a vida nos levou por diferentes caminhos.
No Portugal desse já distante ano de 2020, a conferência parecia inserir-se em mais uma tentativa de mudança, apontava a possibilidade de surgirem práticas inovadoras. Os palestrantes dissertaram sobre a diferença entre mudança e inovação, lendo power point repletos de sofisticação do discurso de teóricos de antigamente. A única diferença era a da tecnologia utilizada pelos palestrantes: o retroprojetor de há décadas fora substituído pelo computador.
Comecei a “palestra” agradecendo o ato de coragem dos organizadores do evento, pois o fato de convidarem este velho professor constituía um verdadeiro ato de coragem. Em 2020, decorria um projeto chamado “autonomia e flexibilização curricular”, que de autonomia e de inovação nada tinha. Após ter desmontado a farsa, dirigiram-me a habitual pergunta:
“Então, se a Escola da Ponte é tão boa, por que é que não há mais escolas como a Escola da Ponte?”
Dei a resposta, também, habitual:
“Não há mais escolas como a Escola da Ponte por sua causa.”
Pareceu não entender. E acrescentei:
“Há meio século, quando me apercebi que, dentro de uma sala de aula, jamais poderia garantir a todos os alunos o direito à educação, tomei a decisão ética de mudar e inovar. Já assumiu esse compromisso ético com a educação? De que está à espera?
O ambiente ficou “pesado”. Manifestei solidariedade ao colega que me tinha interpelado. Disponibilizei-me para o ajudar a ultrapassar a crise moral em que estava imerso.
A Escola da Ponte nunca fora perdoada por ter ousado flexibilizar o currículo, ser autônoma e se libertar de uma corrupção moral estruturante do “Sistema”.
Os serventuários do “sistema” afirmavam serem as minhas “concepções controversas, românticas e lunáticas”. Eu ignorava a verborreia dos críticos e não respondia aos comentários insultuosos, que enlameavam as redes sociais. Seguia o conselho de Demócrito, que dizia ser a palavra a sombra da ação.
Ao longo do século XX, autores de nomeada já apelavam à necessária harmonia entre pensamento e palavra, bem como à coerência entre palavra e ação. Para Freud, o pensamento era o ensaio da ação. Bergson escreveu:
“Pense como um homem de ação, atue como um homem de pensamento.”
E Freire afirmava:
“Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.”
Na peça Man and Superman, Bernard Shaw escreveu: “those who can do; those who can't, teach”, expressão irónica bem ao seu estilo, que a cultura popular traduzia por “quem tem competência que se estabeleça”. Isto é: “quem sabe faz, quem não sabe ensina”.
Quem não sabia ensinar desistia do trabalho no árduo chão da escola. Fazia um doutoramento qualquer, arrogava-se “especialista” e criticava o que não conseguia entender nem fazer. Assessorava projetos ditos “inovadores”, fazia formação de professores e vendia palestras de cuspe e power point.