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Mostrando postagens de agosto, 2025

Cidade do Porto, 31 de agosto de 2045

  E chegamos à última carta dedicada à Avaliação. O amigo Wilson esboçou uma "tradução", tentando ajudar à compreensão do modo como como avaliávamos. “No Brasil, chama-se "recuperação" ao período, em geral, no final do ano letivo, em que os alunos que não conseguiram somar nota suficiente para serem aprovados numa determinada série e passar para a serie seguinte, recebem aulas de reforço nas áreas em quais apresentaram maior dificuldade. E fazem nova prova. Se não conseguirem nota suficiente na recuperação, os alunos são reprovados e repetem o ano. Os que conseguem nota suficiente na recuperação são aprovados e "passam de ano". Não sei o nome que se dá a isto em Portugal. E não sei, porque minha filha estudou em Portugal apenas na Escola da Ponte. E na Escola da Ponte não existe algo como "ano" ou "série" para o aluno repetir. Nenhum aluno na Ponte "repete o ano", assim como também não "passa de ano". E com...

Vitória, 30 de agosto de 2045

  Não sei se entendi muito bem a respeito da avaliação, mas acredito que a avaliação deva ser contínua e cumulativa, ou seja, todos os dias o aluno poderá ser avaliado e levará em conta aquilo que ele sabe e não o que não sabe. Será que é isso? A Ponte não era diferente de outras escolas. Em 1976, estávamos saindo de uma mudança de regime político. Os professores eram mal pagos e queixavam-se de que não podiam dar mais tempo à escola, porque tinham de ganhar proventos em outro lugar. Hoje, os professores são bem pagos e... fazem o mesmo tipo de trabalho. No ano anterior àquele em que cheguei à Ponte, eu trabalhava numa escola bem longe de casa e o salário que eu ganhava mal dava para pagar o transporte, a alimentação e alojamento. Na Ponte, encontrei professores desmotivados, que trabalhavam de modo igual ao dos que foram seus professores (e igual ao que ainda hoje se faz na grande maioria das escolas). O que mudou? Um dos grandes equívocos da "progressão continuada", q...

Carvalhos, 29 de agosto de 2045

“Como é coordenada e avaliada a Educação Física? De que forma as crianças decidem o que querem fazer, uma vez que determinadas atividades são necessárias para o desenvolvimento de habilidades relacionadas a lateralidade, a questões de ordem motora etc.? Espero que tenha sido clara a minha questão, pois desconheço termos técnicos da área para ser mais objetiva. Neste ano, tentamos fugir um pouco das modalidades mais tradicionais, tais como: futebol, voleibol, handebol etc. Temos grupos a trabalharem o Parkour, a Dança (Salsa). Os alunos pela “primeira vez” trabalha de uma forma mais dirigida, com atividades que lhes propiciem um desenvolvimento motor mais global, e são reforçados em aspetos que os ajudem na sua aprendizagem mais cognitiva, como, por exemplo, a lateralidade. Temos que seguir o currículo nacional, mas temos liberdade de lidar com as propostas de forma diferenciada, portanto, o que não se abordar num ano, no outro provavelmente se abordará, dando-nos maior liberdade ...

Serra do Pilar, 28 de agosto de 2045

“Como é feito o trabalho e avaliação com Arte Dramática? Ela é trabalhada como conteúdo específico, dentro de outros conteúdos? Existem apresentações? Foram estabelecidos alguns momentos para que os professores de artes realizem atividades com os alunos. Os conteúdos de artes não estão elencados e expostos nas paredes como os das outras disciplinas. O projeto da Casa da Música, foi um projeto que aconteceu em parceria com outros profissionais de fora da escola, inclusive com uma professora inglesa. Foram duas semanas de oficinas (dramatização, figurino, cenário, sonoplastia), onde os alunos, principalmente de tarde, participavam de atividades para a elaboração de um espetáculo. Penso que a perceção do que acontece na Ponte demora algum tempo a fazer. Tentando ajudar: Tal como em todas as outras áreas não há aulas. Os alunos planificam o seu trabalho e decidem o que pretendem fazer. Há trabalhos que implicam um grupo de alunos e, nesses casos (conversam, para chegar a uma conclusã...

Arrábida, 27 de agosto de 2045

(continuação) É justamente por ser uma atividade complexa que a autoavaliação precisa ser praticada constantemente. Eles compreendem que é a partir da autoavaliação que podem seguir o planejamento. É uma prática cotidiana, que ensina a necessidade da reflexão no processo de construção do conhecimento. “Aprendi muito com essa perspetiva de avaliação da Ponte. Gostaria de maiores esclarecimentos sobre o processo avaliativo destes alunos e como trabalhar com hábitos e atitudes para obter disciplina. Estou muito curiosa com esta escola e com sua vivência. E fantástico saber que existe neste mundo escolas que não precisam de portões e que seus alunos têm professor-tutor para auxiliá-los nas atividades escolares e que também estão responsáveis pelo contato com os familiares.” Como é bom compartilhar esse sonho com vocês. Depois podemos compartilhar nossas próprias experiências, tenho certeza de que todos têm ricas histórias para contar. Realmente, a avaliação é encarada como processo, ...

Mindelo, 26 de agosto de 2041

  Hoje, é dia de aniversário da Mãe Luiza. Já não tem idade e jamais deixei de sentir a sua inefável presença. Acompanha-me nas andanças da vida, tal como a aliança que ela usou no dia do seu casamento e que ajustei ao meu dedo anelar. A sua memória me ajuda a suportar as dores deste corpo envelhecido e se mistura com outras memórias, que desejaria erradicadas. Por que invoco a doce Mãe Luiza à mistura com um arrazoado mais ou menos amargo? Suspeito de que se trata de uma cilada da memória. A de longo prazo está atafulhada de informação inútil. Lamentavelmente, se mistura com maternas recordações. Inevitavelmente, o vício de pensar a existência pelo viés da educação me conduz a reflexões mais ou menos pedagógicas. Vivíamos num tempo de crise de valores, de uma crise educacional a exigir um compromisso ético, e fazíamos a nós mesmos duas perguntas: Para se refundar a educação, não teríamos de repensar a escola? O amigo Severino dizia que cidadania era a medida da qualidade de ...

Oliveira do Douro, 25 de agosto de 2045

(continuação da cartinha anterior) Para que aprendam a gerir as suas aprendizagens, orientamo-los no sentido do que é importante/interessante aprender/descobrir e, portanto, devem planejar tudo o que é suposto quererem saber. O que acontece muitas as vezes é que interessam-se mais por umas disciplinas que outras, deixando de lado algumas tarefas. Isso poderá ter a ver com a dificuldade de determinada tarefa. Esta criança deverá, em determinado tempo, começar a compreender que deverá utilizar o dispositivo "Preciso de Ajuda". “Na opinião de vocês, professores da Ponte, esse seria um dos motivos relativos à evasão escolar? O seu mau emprego da avaliação pode expulsar o aluno da escola, causar danos em seu autoconceito, impedir que ele tenha acesso a um conhecimento sistematizado e, portanto, restringir a partir daí suas oportunidades de participação social?” É verdade que o abandono acontece em outras escolas. A Escola de Massas, enquanto projeto emancipatório da modern...

Gervide, 24 de agosto de 2045

  Permanecendo no diálogo sobre a avaliação que se fazia na Ponte… “Vocês poderiam nos contar algumas protagonizadas pelos atores da Escola da Ponte?” Sempre que os alunos (e em alguns casos também os professores) pensam que algo que está a acontecer no Mundo, no País, ou na Vila, é realmente importante, existe total liberdade para isso ser trabalhado no dia-a-dia e, em alguns casos, até por toda a escola. Na área do ambiente, os nossos alunos estão envolvidos no Eco Escolas e nos Jovens Repórteres para o Ambiente e, dessa forma, socializam o seu trabalho (nomeadamente na festa de S. João). Neste ano, iremos abraçar o projeto ENEAS e no âmbito do mesmo será realizada a monitorização do Rio Vizela e os resultados serão divulgados em toda a comunidade. A Ponte tenta mostrar à comunidade todo o seu trabalho (especialmente no final do ano). Contudo, penso que ainda é uma área em que poderemos melhorar muito. Ainda estamos a tratar algumas feridas recentes de lutas travadas co...

Paranhos, 23 de agosto de 2045

 N a transição para o vigésimo primeiro século, a Ponte ainda suscitava curiosidade. As perguntas não paravam de chegar até nós. “Gostaria de saber como acontece a avaliação deste projeto. No decorrer do ano, pela observação das aprendizagens envolvidas? Por todos, em assembleia? Existe um momento de avaliação (ou autoavaliação) somente entre professores do referido projeto? A todas as perguntas respondíamos, em solidários atos. Eu não compreendi muito bem a sua referência a "um projeto comum que servirá como tema e referência a toda a escola". Nós estabelecemos algumas linhas de ação para o nosso trabalho, no sentido de o melhorar. Estas linhas de ação, fundadas no projeto educativo, resultam em grande medida dos balanços efetuados no final do ano anterior. Estes balanços são efetuados pelas tutorias, pelas responsabilidades, pelas dimensões, pelos núcleos e pela equipa. Paralelamente, são realizadas aferições, num processo de transformação em que todos mudamos alg...

Porto, 22 de agosto de 2045

Deixo aqui o registro de alguns dispositivos de avaliação utilizados na Ponte. Alguns destes instrumentos foram sendo dispensados ou reformulados, ao longo dos anos e - creio bem! - sê-lo-ão, nos próximos dez ou vinte anos. No Relatório, cada grupo descreve processos de descoberta. O Álbum é o produto de recolhas críticas de material para arquivo e consulta. As Bibliografias são instrumentos de apoio a consultas, elaborado no início do desenvolvimento de cada plano quinzenal. A Ficha de autoavaliação é feita com ou sem a presença do professor e pode ser autocorretiva. O Teste de itens selecionados pelos alunos é elaborado ao longo de qualquer projeto e negociado com os professores. O Teste sociométrico e o Inventário de atitudes são utilizados apenas quando são percetíveis alguns sinais de conflito entre alunos, no interior dos grupos ou entre grupos. A Ata é redigida pelos alunos após um debate na Assembleia, ou um trabalho de grupo. Permite comparar opiniões e níveis de...

Vila Nova de Gaia, 21 de agosto de 2045

  A cartinha de ontem terminava com um comentário: “Lembro-me de uma professora que, sempre prevenida, carregava consigo testes que ameaçava aplicar, se as coisas não corressem como havia planeado.” A professora responde ao comentário: O carácter recorrente da aplicação desta "arma infalível" leva-me hoje a acreditar que jamais esta professora se apercebeu de que os "indisciplinados" eram alunos cuja autoimagem se tinha destruído gradualmente. Neste dia de há vinte anos, o vosso avô encontrava-se hospitalizado – cuidava de si, para poder cuidar de outros. Por esse tempo, empresas abútricas vendiam aulas de “sócio emocional” para alunos, esquecendo que seria prioritário cuidar do sócio emocional dos professores. E os adultos “docentes” projetavam nas crianças e jovens discentes frustrações, traumas mal resolvidos. Por isso, a Luísa nos dizia que o oposto do amor era a indiferença: “O que é importante é ter relações emocionais que sejam significativas, e há ...

Boa Água, 20 de agosto de 2045

(continuação da cartinha anterior) A "escola tradicional" utiliza um modelo de avaliação que está de acordo com o trabalho que os alunos desenvolvem. E para mudar a avaliação é necessário mudar todo o trabalho escolar. Parece-me que, no resto do seu texto, já chegou a uma conclusão muito interessante: todos os alunos têm o seu ritmo. O que nós tentamos na Ponte é que efetivamente cada aluno veja reconhecido o seu ritmo e que, paralelamente, a avaliação também seja para cada aluno uma oportunidade de aprendizagem. Compreendo perfeitamente o que diz. A Ponte não foi a primeira escola onde trabalhei e sei que isso pode ser complicadíssimo, muito difícil, mas o que será melhor: ter diferentes ritmos dentro da "sala", ou tentar que seja o mesmo e único ritmo e vivermos no eterno dilema de "deixar alunos para trás" ou "atrasar outros alunos"? Outra pergunta: “Percebo que o objetivo da Ponte é proporcionar aos alunos um clima adequado, onde se...

Évora, 19 de agosto de 2045

Continuando a última resposta da cartinha de ontem… avaliando a avaliação que a Ponte fazia. A avaliação pode ser efetuada de várias formas: uma conversa, um exercício escrito, a resolução de um problema etc. Tudo depende do objetivo em questão Por outro lado, tenta-se sempre que os objetivos anteriores também sejam avaliados, de forma que a avaliação seja um processo contínuo.  Quando um determinado aluno pensa que esgotou todos os recursos ao seu dispor para estudar um determinado assunto (biblioteca, computador, colegas), e não o conseguiu compreender, recorre ao professor, escreve o seu nome, a data e assunto em estudo na folha do "Eu preciso de ajuda". Depois, o professor dirige-se ao aluno que manifestou a dificuldade e tenta esclarecê-lo, recorrendo àquilo a que os alunos costumam chamar de "aula direta".  Por outro lado, atitudes do quotidiano, em Assembleia, nos Debates e nas apresentações dos trabalhos constituem, também, excelentes oportunidades de avalia...

Montemor-o-Novo, 18 de agosto de 2025

De pergunta em pergunta, de resposta em resposta se vai desvendando o modo como na Ponte se avaliou. Escutemos o pai de uma aluna: Como professor, minha atuação acontece principalmente no ensino pós-secundário, que engloba o nível superior, a educação corporativa e a educação continuada.  Tenho por pratica sempre propor ao aluno atividades e processos de avaliação que incluem sempre autoavaliação. Pois vocês não imaginam como é difícil, para quem passou a vida inteira sendo avaliado por outros, esperando coisas como notas, graus, conceitos etc., se autoavaliar! Falta pratica!  Não estamos habituados a isto. E sentimos tanta dificuldade! Agora, imagine uma criança da Ponte: dia após dia, mês após mês, ano após ano, por nove anos seguidos, pegando um objetivo de aprendizagem, fazendo atividades de aprendizagem para atingir aquele objetivo, se auto avaliando, concluindo que se sente apta a procurar um professor, para que este confirme, ou não, sua autoavaliação.  Depois, peg...