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Mostrando postagens de outubro, 2025

Morada das Águias, 31 de outubro de 2045

Não mais esquecerei a primeira visita à casa de Darcy. A Adriana, a Cláudia, a Andréa e a Natália me levaram até lá, e me deixei possuir por forte emoção. Senti que, nesse o lugar teria início um projeto, que deveria resgatar a memória do insigne Mestre. O espírito de Darcy se fez presente num breve encontro com excelentes educadores. Ali, Darcy escrevera derradeiras palavras, quando o câncer consumia o seu último sopro de vida, depois de sofrer um longo exílio e enquanto o seu país “dormia distraído”. Darcy regressava ali, onde se esperava recuperar a sua memória. Em 1977, numa palestra com o título “SOBRE O OBVIO”, Darcy Ribeiro proferiu a seguinte frase: “A Crise da Educação no Brasil não é uma Crise, é um Projeto”. Decerto sabeis por que terá Darcy Ribeiro feito tal afirmação e de que “crise” se tratava. Qual era o projeto a que Darcy se referia? Também dissera: “Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca.” Que o Brasil “n...

Imbassaí, 30 de outubro de 2045

As obras do Mestre Darcy sobre a identidade da América influenciaram estudiosos latino-americanos críticos da visão eurocêntrica presente nos estudos sobre os povos originários do Brasil e do sul. Darcy afirmava que, nos trópicos, havia uma outra forma de se viver e de sentir a vida. A Educação do Sul não era o atraso, mas o futuro do mundo. Vivia-se um tempo de agitação e de esperança, mas a realidade era calamitosa. A Escola Pública fora “sucateada”, e ram elevados os índices de evasão de alunos e de reprovação, num país que exilara uma geração de ouro de pedagogos, pioneiros do escolanovismo, cujo legado poderia infletir a crítica situação. Decorridos cinquenta anos, o panorama era idêntico ao da década de oitenta. A “escola pública” se desenvolvera alheia a realidade locais, que era uma “grande peneira de alunos”. No abril de há vinte anos, atualizávamos e praticávamos Darcy. Até então, o nome do insigne mestre apenas havia sido usado por políticos e universitários em palestras...

Bom Jesus dos Perdões 29 de outubro de 2045

No outubro de 2025, tive o pressentimento de que talvez estivesse chegando o “tempo da delicadeza” profetizado pelo Chico. Enquanto o projeto da Comunidade da Lagoa de Maricá esteve suspenso, aguardando que o poder público assumisse a sua responsabilidade – vos lembro que fora a secretaria de educação que solicitara a criação de uma Rede de Comunidades – fomos “Praticando Darcy”, tentando dar forma ao seu intento de acabar com “uma crise que era um projeto”. No encontro de fevereiro, à semelhança do que acontecia na Ponte – lá, antes de dar início a uma reunião, havia, canto, dança, poesia…. – foi lido um poema de Darcy: o “ Idos sidos ” “Que é que fiz, não fiz, de mim? Que é que fiz na vida, da vida? Quem sou eu? Esse eu que me sou. Minhas mãos me pendem soltas. Inúteis para fazimentos. Só servem para escrever, acarinhar. Não sei dançar, nunca soube. Olho, idiota, o céu estrelado. Não conheço estrela nenhuma. As árvores, tantíssimas, que vi., Recordo inumeráv...

Barra de Maricá, 28 de outubro de 2045

No dia 8 de fevereiro de 2025, nos reunimos no Museu Casa Darcy Ribeiro. Nesse encontro de educadores assumimos contribuir para concretizar objetivos constantes do Termo de Referência recebido da secretaria de educação: “A superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação; A melhoria da qualidade da educação, com ênfase em valores morais e éticos, e na promoção humanística, científica, cultural e tecnológica; A prática de princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade e sustentabilidade socioambiental; A valorização dos profissionais da educação, através da criação de contextos de “Escola Cultural” – uma nova construção social de aprendizagem.” Há quarenta anos, quando era voluntário no Projeto Âncora, escrevi uma “Carta para Darcy Ribeiro”: “No tempo dos CIEP”. Recordo-me de a ter escrito no bar do Beijôdromo ( uma inovação arquitetónica do arquiteto João Lima – para Darcy, o Lelé) ,...

São José, 27 de outubro de 2045

Netos queridos, surpreendestes-vos com a minha afirmação de que o velho Sistema já não mereceria o benefício da dúvida. Mas, foi justa a minha afirmação, apesar das tentativas de interromper o estertor do Sistema, perpetrados por embusteiros de origem vária. Nos idos de vinte, a escola permanecia estagnada, imersa num pântano de absurdos. Arcaboiços da escola da modernidade tinham perdido sentido e legitimidade. Lamentavelmente, o discurso acadêmico insistia no recurso a conceitos e práticas fósseis, ainda que assumindo um “novo visual” – e estava em voga o chamado “ensino híbrido”. Explorando a ingenuidade pedagógica da “sociedade líquida”, empresas assaltavam o mercado da educação com o novo “produto”. Iludindo professores de boa-fé . As aclamadas “boas escolas” de educação híbrida eram caricaturas de práticas centenárias ornamentadas com computadores e Internet. Não poderia faltar a famigerada “sala de aula invertida”. Dela se dizia “colocar o aluno como protagonista”. Grossei...

Maricá, 26 de outubro de 2045

No dia 26 de outubro de 2025, celebrávamos a memória de um extraordinário educador: Darcy Ribeiro. Completavam-se 103 anos sobre o dia do seu nascimento. Darcy foi relator da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, produziu uma obra vasta sobre povos indígenas do Brasil e da América Latina e, como educador e político, teve papel central no planejamento e implantação dos CIEPs – Centros Integrados de Ensino Público. Neste dia de há vinte anos, o Núcleo de Projeto de Maricá reuniu, para celebrar a memória do ilustre educador e para preparar o recomeço do projeto “Praticar Darcy”. Esse projeto decorreu de um pedido feito pela Secretaria de Educação. Em 2022, fui incumbido de criar uma “Rede de Comunidades de Aprendizagem” no município de Maricá. Adquiri um espaço destinado a ser uma comunidade de aprendizagem. Enquanto pude, lhe conferi sustentabilidade legal, científica e económica. Como sempre trabalhei em equipe, em 2025, consegui reunir um quadro de dedicados educadores e re...

Itaipuaçu, 25 de outubro de 2045

Nos idos de vinte, as escolas careciam de espaços de convivencialidade reflexiva. Os professores careciam de procurar compreender que pessoas eram aquelas com quem partilhavam os dias, quais são as suas necessidades (educativas e outras). Seria preciso cuidar da pessoa do professor, para que ele se visse na dignidade de pessoa humana e visse os outros educadores como pessoas.  Seria preciso saber fazer silêncio “escutatório”, fundamento do reconhecimento do outro, rever a nossa necessidade de desejar o outro conforme a nossa imagem, respeitá-lo numa perspetiva não-narcísica, ou seja, aquela que respeita o outro, o não-eu, o diferente de mim, aquela que não quer catequizar ninguém, que defende a liberdade de ideias e crenças. Isso também seria um caminho para a inclusão.  Sempre que um professor se assumisse individualmente responsável pelos atos do seu coletivo... incluía-se. Mas, nas escolas, tardava o reconhecimento da divergência, da dessemelhança, enquanto abundavam exempl...

Guarujá, 24 de outubro de 2025

Muitos anos decorridos sobre a primeira vez que prestei colaboração ao meu amigo Mohamed, voltei a Guarujá, para participar no congresso da OMEP – oportunidade de escutar educadores de primeira água, de aprender com as descrições dos seus projetos e de conhecer uma mulher corajosa, generosa, de nome Eneida. Dela vos falarei em próxima cartinha. Outro dia de outubro, o 24 de outubro de 1976 foi um domingo, o dia em que nasceu o Professor André Pacheco. Na terça-feira seguinte – 26 de outubro de 76, munidos de um projeto e um regulamento, com a recentemente criada Comissão de Pais, se elaborou um rascunho de Estatutos da Associação de Pais, no ano seguinte criada ao abrigo do da Lei 7 / 77.    Quatro anos antes, no outubro de 1972, eu havia redigido um texto que tinha por título “Democraticidade e Participação”. Em tempo de ditadura, isso me valeu uma admoestação e algo mais… Porque a ditadura era implacável, não admitia divergências de um jovem professor de uma classe masculina...

Alvorada, 23 de outubro de 2025

Nesta cartinha se completa uma longa (e necessária) transcrição. Dela constará uma súmula de Direitos e Deveres propostos e aprovados em reuniões da Assembleia da Escola.  Em 1976, fora elaborada a primeira “Carta Magna”, numa Assembleia de Alunos, uma espécie de “Acordo de Convivência”, que regulou o sistema de relações durante cerca de trinta anos e preparou o caminho para o pleno exercício de autonomia, no contexto de uma organização de escola pautada numa responsabilidade responsável.  Em 2025, o comportamento pessoal e social de ex-alunos com mais de quarenta, cinquenta ou sessenta anos de idade é prova de que o Fazer a Ponte – assente numa matriz axiológica coerente com a prática – operou profundas transformações. Delas vos falarei em outras cartas. Por agora, fiquemos pela ffinalização da transcrição do Regulamento Interno.  (E agradeço a vossa paciência). e) Contribuir, em conjunto com as atividades desenvolvidas no âmbito dos Núcleos de Projeto, dos complementos ...

Pelotas, 22 de outubro de 2025

Completando o capítulo “Articulação Curricular”: c) A dimensão do desenvolvimento naturalista; d) A dimensão do desenvolvimento identitário; e) A dimensão do desenvolvimento artístico. O projeto curricular de cada aluno compreenderá não apenas as dimensões referidas no número anterior, mas ainda a dimensão tecnológica, entendida numa perspetiva eminentemente transversal e instrumental, e o domínio afetivo e emocional. 4- A equipa de cada Núcleo de Projeto integrará orientadores educativos mais vocacionados, pela sua formação e experiência profissionais, para apoiar e orientar, numa perspetiva de acrescida especialização, o percurso de aprendizagem dos alunos em cada uma das dimensões curriculares fundamentais. 5- O Regimento do Conselho de Projeto enunciará os modelos e as formas operacionais a que deverá obedecer a articulação curricular.  Assembleia de Escola 1- Enquanto dispositivo de intervenção direta, a Assembleia de Escola é a estrutura de organização educativa que proporcio...

Viamão, 21 de outubro de 2025

(Quase completando uma longa “maratona” de leitura… Espero concluí-la, amanhã). (…)  b) Pelos demais orientadores educativos da Escola;  c) Por um representante do Serviço de Psicologia e Orientação. 2- Nos termos do respetivo Regimento, poderão ainda fazer parte do Conselho de Projeto, designados em regime de cooptação, outros membros da comunidade escolar. Presidência A presidência do Conselho de Projeto é assegurada pelo Coordenador Geral de Projeto ou por quem as suas vezes fizer. Competências Ao Conselho de Projeto compete: a) Elaborar e aprovar o seu Regimento; b) Elaborar as propostas de alteração ao Projeto Educativo de Escola; c) Elaborar as propostas de alteração ao Regulamento Interno da Escola; d) Aprovar orientações relativamente à elaboração de projetos; e) Pronunciar-se sobre as propostas de celebração de contratos de autonomia; f)  Aprovar as estratégias de formação contínua do pessoal da Escola; g) Aprovar orientações no âmbito da organização e gestão cur...

Canguçu. 20 de outubro de 2025

Netos queridos, concordo convosco: esta leitura é cansativa. Mas, também, é indispensável, para quem, como os professores, aspira a criar condições de assegurar a todos os alunos o direito à educação. Este regulamento poderá ser referência para quem pretende agir numa escola democrática, berço de cidadania. E reparai que este documento data de 2004, quando ainda não se recorria à sociocracia na tomada de decisões. Continuando a transcrição do Regulamento… h) Definir os requisitos para a contratação de pessoal docente e não docente, nos termos do contrato de autonomia e com observância das normas aplicáveis do presente Regulamento; (Em concurso universal e com critérios bem definidos, a Escola da Ponte selecionava e contratava os seus professores. Mais tarde, à revelia do Contrato de Autonomia, o ministério alterou a forma de “recrutamento”) i) Proceder à seleção do pessoal docente e não docente da Escola; j) Proceder à abertura de concurso para a admissão do Gestor; k) Proceder à atrib...

Eldorado do Sul, 19 de outubro de 2025

Uma intenção me guia nestas transcrições: a de disponibilizar um núcleo documental-base de efetivas mudanças – foram estes documentos que tornaram autónoma a Escola da Ponte. Continuo a descrição do Regulamento. Duração dos mandatos 1- O mandato dos representantes dos Encarregados de Educação de cada Núcleo de Projeto e do representante das atividades culturais ou socioeconómicas locais tem a duração de um ano letivo. 2- Os membros do Conselho de Direção são substituídos no exercício do cargo sempre que perderem a qualidade que determinou a sua eleição ou designação. 4- As vagas resultantes da cessação do mandato de qualquer membro do órgão são preenchidas nos termos do respetivo Regimento. Competências 1- É da competência do Conselho de Direção: Elaborar e aprovar o respetivo Regimento; Eleger o seu presidente; Ratificar a designação do Coordenador Geral do Projeto e dos Coordenadores dos Núcleos de Projeto e aprovar a substituição dos mesmos; Aprovar as alterações ao Projeto Educat...

Ipê, 18 de outubro de 2025

Poderá ser fastidioso ler todo o Regulamento, mas ele foi redigido em coerência com o Projeto e precisaria ser minucioso, para que pudesse conter todos requisitos do funcionamento de uma escola verdadeiramente democrática. Continuemos... Sobre os Órgãos da Escola: Conselho de Pais/Encarregados de Educação O Conselho de Pais/Encarregados de Educação é a fonte principal de legitimação do Projeto e o órgão de apelo para a resolução dos problemas que não encontrem solução nos demais patamares de decisão da Escola. Composição e Funcionamento 1- O Conselho de Pais/Encarregados de Educação é constituído pelos encarregados de educação de todos os alunos matriculados na Escola. 2- Cada aluno é representado no Conselho pelo encarregado de educação indicado no respetivo boletim de matrícula, o qual, para o efeito, não poderá fazer-se substituir. 3- As reuniões do Conselho são convocadas e dirigidas pelo Coordenador Geral do Projeto, com uma antecedência mínima de cinco dias úteis, nos termos do r...